sexta-feira, 19 de junho de 2015

we should

Saudade daquela vila feita cidade, plantada na margem do atlântico e dos braços de homens que puxam redes e dos braços de mulheres que puxam esses homens e da destreza das facas com que esventram e do sorriso franco rasgado na pele curtida pelo sol e pelas dificuldades de uma vida curta demais. Saudade daquele local onde a luz penetra directamente na alma e onde o vento, ao contrario da via sagrada de Dafní, gela o corpo compondo uma paisagem interior de beleza, glacial do branco que cavalga a espuma das ondas a esfarelarem-se nos rochedos com nome de santos e elementos prosaicos da vivencia da terra como paragem ou boca da baleia, e nem a visao do terceiro andar daquele predio com dois elevadores que nao utilizava ja ha tres anos substituia, nem a silhueta da torre eiffel, nem o caudal que se ia espraiando por baixo de pontes engalanadas mitigava aquela imagem daquele cais onde eternamente uma mulher de bronze esperava o seu marido com um medalhão ao peito com a sua figura. Relicario particular de dor e salvação, presença sempre ausente que é preciso lembrar para nao estranhar os seus bracos feitos de nós quando chega ou para nao se perder o nome levado pelo mar e pela miseria dos pés descalços e boné na cabeca enquanto os ventos das fiordes rasgam sulcos na pele e os maços de SG Gigante caem borda fora.
Ele que não tinha ido para Paris para se tornar artista ou fazer um doutoramento mas tão somente para se esquecer da sua presenca, para ganhar distanciamento da vida, para fingir que não estava a desistir apenas porque o local onde escolheu desistir era essa cidade onde muitos dos seus heróis viveram de passagem. Era essa característica de passagem que o fez ir, para fazer a passagem de si mesmo, algo inominavel, algo que não definia sob pena de ter que assumir que estava a fazer uma passagem para se encerrar na sua mente, cada vez mais estranha e cheia de nervos retorcidos.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

Torpor

"O Syriza é a cirrose da Europa, a desgraça dos gregos intoxicou o projecto europeu."
João Figueiredo, PSD

Creio que o sr ministro das finanças Grego não esconda ouzo na lata do capitalismo mas, quem sabe? no lugar dele eu era capaz de esconder. Creio, aliás, que aquele olhar, esta imagem de desespero e resignação na derrota não são, de facto, uma imagem do desespero e da derrota que esperamos, são o aceitar de uma cortina de ferro. os países não morrem, não abrem falências, não cessam a sua actividade. As nações não se esquecem, os povos ou são total e completamente dizimados ou continuam clamando pela sua pátria. Os países mudam, as alianças transformam-se e as bandeiras são substituídas, não há projecto europeu que avance sobre a identidade de um povo, não há bandeira nacional que fará europeia, e uma cortina de fumo, de morteiros, ergue-se perigosamente próximo da Grécia e a Turquia não é tão estável que possa substituir os portos helénicos na NATO.


Foram os Gregos, e o despotismo, e os radicais do Syriza que fizeram isto tudo estalar, foi a banca grega que é corrupta, a fuga aos impostos das empresas gregas, os grandes conglomerados de armadores que colocaram capitais em paraísos fiscais como as Bahamas, ou o Luxemburgo. Só os gregos claro está, o resto está tão impoluto como um recém nado, e a Europa faz muito bem em não ceder, claro está. Não seria justo para os que cumpriram e com esforço e sacrifício seguiram as doutas linhas de orientação do FMI BCE e Comissão. Receita para o sucesso claro está, pelo menos da banca alemã que foi a primeira a ser paga com o dinheiro dos resgates. Resgate é de facto um bom termo, mas todos já vimos filmes suficientes para saber que no fim os raptores matam a vítima.


Tudo bem, porreiro da vida como dizia o outro, os Gregos vão-se, aliás, já começaram a imprimir dracmas para pagar salários e pensões no final do mês e a Zona Euro controla a saída desviando-se das ondas de choque qual boneco de animação. Afirma-se por aí que sabemos todos o que vamos fazer, aqui pelo burgo até se diz que até Dezembro está tudo bem, cofres cheiinhos.


Então os Gregos que se amanhem que o problema é deles, solidariedade só para bons alunos, os maus da fita tem que ser castigados, desde que nada aconteça aos outros. Óptimo, tudo assinado, tratado e esterilizado. Mas?…. afinal os países podem sair do euro? Ai podem? Então se eu apostar na saída de hmmmm deixa cá ver um fraco hmmm portugal e o estrangular até os cofres ficarem vaziinhos o que é que acontece mesmo? Ah, mas portugal não tem quase dívida grega, não vai ser afectado com a saída e o euro até pode baixar aí uns 20% para compensar promovendo as exportações. Espera lá, as exportações portuguesas são para onde mesmo? Europa? Pagas em euros? e a dívida? grande parte em dólares? Ah, então se calhar já não fica tão bem. Mas o BCE tem a mão por cima da dívida deles, intervém no mercado se for necessário. Intervém? e se eu chamar uns tipos com quem costumo fumar uns charutos e começar a fazer barulho contra frança e alemanha? será que o BCE continua a tentar salvar portugal ou corta as perdas? Tonterias, afinal os Mercados são racionais e vão perceber que ficamos todos melhor sem a Grécia e vai apostar que nos salvamos todos emprestando massa a rodos a juros baixinhos, até mesmo negativos.


E a Hungria páh? e a Ucrânia? e a Rússia? Não sejas aborrecido, não há risco nenhum, não há contágio, não vai acontecer nada à economia portuguesa, o euro vai sair mais forte e a UE vai ficar ainda mais catita. Já te disse que a culpa é dos Gregos e do Syriza.

segunda-feira, 8 de junho de 2015

I know…


é lento o lento passar dos dias, começava assim a música na minha cabeça.
há mais de um ano que sei, que o rei não estava na melhor das formas, mas sempre achei que aquele pó, mágico, de tijolo ia ser o elixir da juventude dele. Ali nada o poderia bater, pensava eu, mesmo que a realidade já tivesse dito o contrário, lá tudo é mágico. Derrotado para mim continuava a ganhar aquela final onde faziam 22 graus e aqui estava um tempo de país tropical. A bola batida, o deslizar, inapto, quase forçado, fazia-nos crer que ele não estava realmente ali. Só um deslizar decente no jogo todo por parte do que ganhou. Não gosto dele, falta-lhe o cavalheirismo, de resto tem tudo para que eu gostasse, a falta de físico adequado, o tipo que não parece nunca ser capaz. Não, não é a melhor esquerda a uma mão, isso é o Gasquet, e como ele gostaria de lá estar, e talvez eu, até, pudesse torcer um bocadinho pela vitória - tudo menos o sérvio, na verdade. Mas lá ganhou o suiço, o que não fica para a história; o que fica, isso sim, é que a maldição do touro permanece… afinal, se calhar, o rei ganhou mesmo a final...

sábado, 6 de junho de 2015

a kind of...

Quando cheguei tudo me era desconhecido e depois como um puzzle as peças foram-me construindo a lembrança. Os pedaços eram colocados com a maior urgência, como pela mão de um gigante biónico que começa por fazer os cantos, para logo passar às bordas, como me dizem que se fazem puzzles, na mesma ordem com que se coze um ovo, primeiro a clara passa do seu estado de placenta para a rigidez plástica do branco e, só depois, a gema começa, languidamente, a enrijecer, sem esquecer o seu estado de compota. O gigante ia atirando as peças para os seus lugar correctos e eu reconhecendo-os com uma familiaridade assombrosa. Primeiro a rua que sobe, o bar que ainda hoje me parece ter levado um chuto que o deslocou umas casas para cima, um agora motel, onde antes era apenas pensão de putas à qual não dei muita atenção. Hoje é impossível não prestar atenção, em todas as janelas letreiros a dizer motel. O gigante continuava a atirar peças a uma velocidade estonteante, e, eu, após seis anos via a geografia do local com cores technicolor. O botéco da esquina agora serve "portuguese tipical food", antes era um pardieiro de copos cheios até transbordar, a rua sobe incrivelmente, não sei como a trilhei antes sem sentir o seu declive. A encimar continua o restaurante com mercearia à entrada, só serve a uns quantos é verdade, por iniciativa própria só compraria cogumelos secos e fugia dali para fora como acometido por uma doença contagiosa qualquer. Reparaste que antes tem um bar de meninas que dançam a partir das seis da tarde? Deve ser por isso que tem lá o motel, uma coisa leva à outra e não há lenocínio para ninguém, tudo dentro das vontades adultas e consentidas, afinal de contas o acto de consumo é algo que a sociedade actual enquadra melhor se feito por adultos. O restaurante continua igual, pelo menos de fora, não entrei. Nem fazia sentido. à frente tem um hotel, sabias? eu não, não o vi, aliás continuo com a sensação que não vi nada, embora guie a mão do ser que põe as peças. é tudo muito estranho e vivido, demasiado vivido até, parece que afinal o gigante não é biónico mas o Kubrcik e nada disto é muito real. Não fosse a minha ida aqueles bancos junto ao rio, à estátua que parece um grupo de gente desenhada pelo Munoz, e o café que serve tostas mistas, o que em Portugal não parece estranho, não acreditaria em nada disto. Não visse o carro bordô estacionado e os momentos antes da partida e juraria que é tudo falso, que o restaurante não existia, que não sabia se tem ou não mercearia, que o clube não mudou de sitio, que o parque de estacionamento não teve um teatro, que não existiram iogurtes de madrugada, que o calor era tanto que nos sentíamos embriagados, que se discutiam livros e loucuras em las vegas, que se falava nas mais inusitadas situações como obrigação. Negaria tudo e mandava o gajo à fava, mas tenho um medo terrível de não conseguir completar o puzzle.   

quarta-feira, 3 de junho de 2015

never pause the music



Paris, não se derrota assim um campeão, de maneira tão justa e tão clara. não se faz, é uma afronta ao sonho vedar-lhe a 9ª em tão pouco tempo, menos de 3h, não é derrota que se possa impor, foi ele que perdeu, não o outro que ganhou (e o outro não é de pouca monta). não se faz, porra